quinta-feira, 10 de abril de 2014

Novalis, excerto de Os Hinos à noite

Busto de Novalis



OS HINOS À NOITE

4

Sei agora quando será a manhã derradeira - quando a luz não afugentar mais a noite e o Amor – quando o sono for eterno e um sonho só inesgotável. Sinto em mim uma fadiga celeste – Longa e penosa foi a minha peregrinação ao Sepulcro Santo, opressiva a minha Cruz. A onda de Cristal, imperceptível aos vulgares sentidos, que jorra no seio obscuro do montículo de cujo sopé o terrestre caudal irrompe, quem dela alguma vez provou, quem esteve no cume das montanhas que delimitam o mundo e olhou para Além, para a nova terra, a morada da Noite – em verdade, esse não regressará jamais aos trabalhos deste mundo, à terra onde a Luz habita em eterna agitação.
Esse é o que levantará no alto as tendas da Paz, o que sente a ânsia e o amor e que olha para Além até que a hora entre todas bendita o faça descer ao imo da nascente – por cima, flutua o que é eterno, reflui ao sabor de tormentas; mas tudo aquilo que o contacto do amor santificou escorre dissolvido, por ocultas vias, para a região do Além e aí se mistura, como os aromas, com os seres amados para sempre adormecidos.
(…)



NovalisOs hinos à noitetradução de fiama hasse pais brandão
assírio & alvim
1998




Existe em nós
um sentido especial para a poesia,
uma disposição poética.
A poesia é absolutamente pessoal,
e por isso indefinível.
Quem não souber nem sentir
de forma imediata
o que é a poesia,
nunca poderá aprendê-lo.
Poesia é poesia.
Diferente, como a noite do dia,
da arte da fala e da palavra.


O amor é a finalidade final
da história do mundo —
o ámen do universo.

NovalisFragmentos são Sementes, Selecção, tradução e ensaio de João Barrento, Roma Editora, Lisboa, 2006.
Pinturas de Caspar David Friedrich (1774-1840).

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