segunda-feira, 4 de março de 2013

Um poema de Giacomo da Lentini

   O doce stil nuovo é claramente debitário da lírica trovadoresca que floresceu em Provença a partir do século XII: nomes como Bertrand de Born, Arnaut Daniel, Bernart de Ventadorn, Giraut de Bornelh e Sordello, dentre outros, são citados por Dante Alighieri em algumas de suas obras. Algumas características fundamentais desse grupo migrariam para a Itália a partir do começo do século XIII, e aqui cito alguns: a) o uso da língua vulgar (langue d’oc, langue d’oil, língua do sì; b) a ligação com a música e formas musicais, como baladas e canções (canzone, derivada da cansò provençal); c) o interesse pela rima como recurso estrutural; e d) diversas temáticas, como a joi diante dos favores da midons (madonna), que engloba muitas vezes uma função alegórica que ultrapassa o sentido meramente erótico dos poemas.
   Dentro dessa história da lírica vulgar italiana, é importante notar a importância do adjectivo nuovo no doce stil nuovo – essa é a característica fundamental no movimento, que implica em seu próprio nome uma tradição lírica já florescente na Itália. Essa história não é tão simples quanto a historiografia e os desenhos cronológicos possam tentar demonstrar; e aqui eu gostaria de fazer uma pequena contribuição às leituras brasileiras sobre o assunto da lírica amorosa no século XIII italiano, com um brevíssimo esboço e duas traduções de poetas que, até onde eu saiba, pouco chegaram ao português.
   A primeira escola poética italiana de renome é a siciliana, em torno de Giacomo da Lentini (ou Jacopo da Lentini, circa 1210-1260); a históri atribuiu-lhe a invenção do soneto, na primeira metade do séc. XIII; e por isso apresento em tradução um dos seus sonetos mais famosos:
 
 
Resolvi no meu peito a Deus servir,
para poder chegar ao Paraíso,
ao santo espaço em que se diz convir
estável alegria, jogo e riso.
 
Sem minha amada não quisera eu ir,
da tez mais branca e loira que preciso;
pois sem ela, nem gozo, nem sorrir,
se acaso desta amada me diviso.
 
Isso não digo pelo pensamento
de que assim desejasse mais pecar;
mas para ver seu belo encantamento,
 
sua bela tez e a paz em seu olhar:
então teria um tal contentamento
se visse minha amada ao Céu se alçar.
 

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