E É DE IMPROVISO NOITE
Cada um está só no coração da terra
trespassado por um raio de sol:
e é de improviso noite.
De «Água e terras», 1920-1929
AMÉM PELO DOMINGO EM ALBIS
Não me traíste, Senhor:
de toda a dor
sou primogénito.
De «Oboé Submerso», 1930-1932
ESTRADA DE AGRIGENTO
Lá perdura um vento que recordo aceso
nas crinas dos cavalos oblíquos
em corridas pelas planuras, vento
que marca e rói o areal e o coração
dos telamões lúgubres, caídos
nos prados. Alma antiga, cinza
de rancores, retorna àquele vento, cheira
o delicado musgo que reveste
os gigantes despenhados do céu.
Como estás só no espaço, que te resta!
E mais te afliges se ouves ainda o som
que se afasta amplo na direcção do mar
onde Hésper já se arrasta matutino:
o grilo tristemente vibra
na garganta do carreteiro que sobe
a nítida colina de lua, lento
entre os murmúrios dos olivais
sarracenos.
De «Novos Poemas», 1936-1942
JÁ VOA A FLOR MAGRA
Não saberei nada da minha vida,
obscuro monótono sangue.
Não saberei quem eu amava, quem amo,
agora que aqui, recluso, reduzido aos meus membros,
no desfeito vento de Março
enumero os males dos dias decifrados.
Já voa a flor magra
dos ramos. E eu espero
a paciência do seu voo irrevogável.
De De «Novos Poemas», 1936-1942
Poemas traduzidos por Sílvio Castro em Poesias Escolhidas, Ed. Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1973
Cada um está só no coração da terra
trespassado por um raio de sol:
e é de improviso noite.
De «Água e terras», 1920-1929
AMÉM PELO DOMINGO EM ALBIS
Não me traíste, Senhor:
de toda a dor
sou primogénito.
De «Oboé Submerso», 1930-1932
ESTRADA DE AGRIGENTO
Lá perdura um vento que recordo aceso
nas crinas dos cavalos oblíquos
em corridas pelas planuras, vento
que marca e rói o areal e o coração
dos telamões lúgubres, caídos
nos prados. Alma antiga, cinza
de rancores, retorna àquele vento, cheira
o delicado musgo que reveste
os gigantes despenhados do céu.
Como estás só no espaço, que te resta!
E mais te afliges se ouves ainda o som
que se afasta amplo na direcção do mar
onde Hésper já se arrasta matutino:
o grilo tristemente vibra
na garganta do carreteiro que sobe
a nítida colina de lua, lento
entre os murmúrios dos olivais
sarracenos.
De «Novos Poemas», 1936-1942
JÁ VOA A FLOR MAGRA
Não saberei nada da minha vida,
obscuro monótono sangue.
Não saberei quem eu amava, quem amo,
agora que aqui, recluso, reduzido aos meus membros,
no desfeito vento de Março
enumero os males dos dias decifrados.
Já voa a flor magra
dos ramos. E eu espero
a paciência do seu voo irrevogável.
De De «Novos Poemas», 1936-1942
Poemas traduzidos por Sílvio Castro em Poesias Escolhidas, Ed. Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1973
Poeta e tradutor italiano, nascido a 20 de agosto de 1901, em Módica, Siracusa, na Sicília, e falecido a 14 de junho de 1968, em Nápoles. Com o intuito de ser engenheiro, frequentou escolas técnicas de Palermo e o Politécnico de Roma. Paralelamente, estudou Latim e Grego na Universidade da capital italiana. Contudo, devido a dificuldades financeiras teve de abandonar os estudos para começar a trabalhar como engenheiro civil para o governo italiano. No entanto, Quasimodo escrevia poesia e, em 1930, publicou três poemas numa revista vanguardista italiana. Nesse mesmo ano, lançou o primeiro livro de poesia, Acque e terre, seguido, em 1932, de Òboe sommerso, obras onde a sua Sicília natal marcou sempre presença. Em 1938, deixou a carreira de engenheiro civil para se dedicar exclusivamente à arte da escrita. Três anos mais tarde, passou a dirigir o Departamento de Literatura Italiana do Conservatório Giuseppe Verdi, em Milão. Nos anos 40, Salvatore Quasimodo repartiu-se entre a produção própria de poesia e a tradução de outros poetas, desde os clássicos do Grego e do Latim (Sofócles, Ovídio,Virgílio, Eurípides ), a William Shakespeare, Molière, Pablo Neruda ou Edward E. Cummings. Durante a Segunda Guerra Mundial, o poeta sentiu-se mais ligado às necessidades do povo e exprimiu isso mesmo nos seus poemas, que resultaram nas obras Giorno dopogiorno e La vita non è sogno, de 1946 e 1949, respetivamente. Os trabalhos seguintes de Salvatore Quasimodo demonstraram um maior apego ao lado positivo da vida, como ficou patente na obra La terra impareggiabile, de 1958. O ponto alto da sua carreira aconteceu em 1959, quando lhe foi atribuído o Prémio Nobel da Literatura. Mas, para além do Nobel, Salvatore Quasimodo ganhou outros galardões como o Prémio Internacional Etna-Taormina, em 1953, que partilhou com o poeta Dylan Thomas.
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